10 ano de KYOTO

Nos 10 anos de Kyoto, o desprezo de seus integrantes
Canadá, Austrália, Japão e EUA barram aprofundamento de acordo contra aquecimento

Cristina Amorim, BALI

O Protocolo de Kyoto completou ontem dez anos e recebeu de presente o desprezo de alguns países ricos, que desejam fugir de compromissos mais rígidos de corte de emissões de gases-estufa dentro do acordo que eles mesmos ajudaram a construir. Durante a 13ª Conferência do Clima (COP-13), que acontece na Indonésia, as delegações do Canadá, da Austrália e do próprio Japão – onde o protocolo foi criado – bloquearam tentativas de aprofundamento para 2013.

Nem uma festa organizada pelo secretariado da convenção, nem um bolo gigante oferecido pela ONG Greenpeace tiraram o gosto amargo da boca de milhares de participantes da conferência. Os três países foram agraciados pelo Fóssil do Dia, prêmio às avessas dado por organizações não-governamentais para quem bloqueia as negociações do clima.

O Protocolo de Kyoto, criado em 1997, estabelece que os países ricos precisam cortar 5,2%, em média, das emissões de gases-estufa, em relação a 1990, entre 2008 e 2012. O único país que não segue essas metas são os Estados Unidos. Os demais trabalham há alguns anos em estratégias de redução de suas emissões. Ainda assim, projeções da ONU indicam que nem todos conseguirão cumprir o prometido.

É o caso do Japão. Com um sistema energético já eficiente, seria complexo e caro cortar suas emissões entre 25% e 40%, até 2020, como deseja a União Européia. A inclusão dessas taxas no rascunho discutido nesta semana na COP-13 foi barrada pela delegação japonesa.

“O Japão está desonrando o compromisso que assumiu”, acusou Marcelo Furtado, diretor de campanhas do Greenpeace Brasil. “Do ponto de vista dos países em desenvolvimento, havia muita expectativa sobre o que os desenvolvidos fariam na COP. O que vimos causa, portanto, imensa frustração.”

A Austrália, que acaba de ratificar o protocolo após anos de distanciamento, também agiu para barrar metas rígidas de corte, assim como o Canadá.

“Hoje, a comunidade internacional comemora o 10º aniversário do protocolo. Mas o novo acordo tem de ser muito maior do que Kyoto”, disse ontem Stavros Dimas, comissário europeu para o ambiente. A União Européia apóia o corte de 25% a 40%. Mas, até ontem à noite, nenhum consenso sobre o tema havia sido obtido entre os delegados na COP-13.

ESPERANÇA DE DECISÃO

A última esperança de mudança surge com a chegada, hoje, dos ministros de 190 países mais a União Européia. Deles espera-se que batam o martelo sobre temas polêmicos e que indiquem qual caminho seguir para conciliar controle da crise climática e desenvolvimento sustentável.

“Isso é muito importante para deixar que ministros de Ambiente resolvam tudo”, ponderou ontem o economista Nicholas Stern, que escreveu um relatório para o governo britânico sobre os custos do combate às mudanças climáticas.

Apesar da observação de Stern, são mesmo os ministros que terão de resolver muita coisa. Após nove dias de extensas reuniões, os negociadores corriam para deixar menos pontas soltas possíveis para seus chefes resolverem, sob pena de decisão nenhuma sair da conferência. Mas ainda faltava consenso – a principal regra de deliberação da ONU – entre os negociadores sobre metas e sobre a inclusão de desmatamento evitado como forma de mitigação.

Nessa rodada de alto nível, o Brasil será representado pelo ministro de Relações Exteriores, Celso Amorim, e pela ministra do Meio Ambiente, Marina Silva. No discurso do Brasil, Amorim destacará a vulnerabilidade da Amazônia frente ao aquecimento global. Alguns modelos científicos indicam que parte do bioma pode ser substituída por um tipo de savana – ou “desaparecer”, como disse o chanceler a jornalistas ontem.

VAIVÉM

Desmatamento evitado de florestas tropicais como forma de mitigação é um dos temas mais quentes de Bali. Ontem à tarde, a delegação brasileira estava confiante em um consenso, construído após Amorim orientá-la a buscar uma coalizão no grupo de trabalho sobre o tema. O Brasil aceitou a entrada de áreas degradadas na conta e também a referência ao manuseio sustentável de florestas. Mas, à noite, o consenso ruiu com considerações de países que, horas antes, haviam concordado com o texto.

A temperatura do debate pode ser medida pelos discursos. No começo da conferência, todos os participantes falavam que as mudanças de uso do solo, entre elas o desmatamento, correspondiam a até 20% das emissões globais anuais de gases-estufa. Agora já se ouve que derrubar floresta emite 20% (cravados) dos gases-estufa num ano.

PRIMEIRA MEDIDA PRÁTICA

A 13ª Conferência do Clima (COP-13) produziu seu primeiro benefício palpável, com direito a palmas, suspiros de alívio e sorrisos pelos corredores. Os participantes chegaram a um acordo sobre o Fundo de Adaptação, essencial para que os países menos desenvolvidos possam se preparar para as mudanças climáticas em curso. O dinheiro virá de uma taxa cobrada nas transações do carbono.

O acordo estabelece que o fundo será gerido interinamente pelo Global Environment Facility (GEF), a contragosto dos países em desenvolvimento. Segundo eles, a experiência mostra que dinheiro que cai no GEF é dinheiro perdido em burocracia, consultas e pesquisas intermináveis, sobrando pouco para a ação de fato. Para piorar, dizem, o GEF é administrado por (e, na prática, para) países ricos.

Em compensação, a destinação será decidida em conjunto, por um grupo de 16 representantes de países industrializados, emergentes e menos desNos 10 anos de Kyoto, o desprezo de seus integrantes
Canadá, Austrália, Japão e EUA barram aprofundamento de acordo contra aquecimento

Cristina Amorim, BALI

O Protocolo de Kyoto completou ontem dez anos e recebeu de presente o desprezo de alguns países ricos, que desejam fugir de compromissos mais rígidos de corte de emissões de gases-estufa dentro do acordo que eles mesmos ajudaram a construir. Durante a 13ª Conferência do Clima (COP-13), que acontece na Indonésia, as delegações do Canadá, da Austrália e do próprio Japão – onde o protocolo foi criado – bloquearam tentativas de aprofundamento para 2013.

Nem uma festa organizada pelo secretariado da convenção, nem um bolo gigante oferecido pela ONG Greenpeace tiraram o gosto amargo da boca de milhares de participantes da conferência. Os três países foram agraciados pelo Fóssil do Dia, prêmio às avessas dado por organizações não-governamentais para quem bloqueia as negociações do clima.

O Protocolo de Kyoto, criado em 1997, estabelece que os países ricos precisam cortar 5,2%, em média, das emissões de gases-estufa, em relação a 1990, entre 2008 e 2012. O único país que não segue essas metas são os Estados Unidos. Os demais trabalham há alguns anos em estratégias de redução de suas emissões. Ainda assim, projeções da ONU indicam que nem todos conseguirão cumprir o prometido.

É o caso do Japão. Com um sistema energético já eficiente, seria complexo e caro cortar suas emissões entre 25% e 40%, até 2020, como deseja a União Européia. A inclusão dessas taxas no rascunho discutido nesta semana na COP-13 foi barrada pela delegação japonesa.

“O Japão está desonrando o compromisso que assumiu”, acusou Marcelo Furtado, diretor de campanhas do Greenpeace Brasil. “Do ponto de vista dos países em desenvolvimento, havia muita expectativa sobre o que os desenvolvidos fariam na COP. O que vimos causa, portanto, imensa frustração.”

A Austrália, que acaba de ratificar o protocolo após anos de distanciamento, também agiu para barrar metas rígidas de corte, assim como o Canadá.

“Hoje, a comunidade internacional comemora o 10º aniversário do protocolo. Mas o novo acordo tem de ser muito maior do que Kyoto”, disse ontem Stavros Dimas, comissário europeu para o ambiente. A União Européia apóia o corte de 25% a 40%. Mas, até ontem à noite, nenhum consenso sobre o tema havia sido obtido entre os delegados na COP-13.

ESPERANÇA DE DECISÃO

A última esperança de mudança surge com a chegada, hoje, dos ministros de 190 países mais a União Européia. Deles espera-se que batam o martelo sobre temas polêmicos e que indiquem qual caminho seguir para conciliar controle da crise climática e desenvolvimento sustentável.

“Isso é muito importante para deixar que ministros de Ambiente resolvam tudo”, ponderou ontem o economista Nicholas Stern, que escreveu um relatório para o governo britânico sobre os custos do combate às mudanças climáticas.

Apesar da observação de Stern, são mesmo os ministros que terão de resolver muita coisa. Após nove dias de extensas reuniões, os negociadores corriam para deixar menos pontas soltas possíveis para seus chefes resolverem, sob pena de decisão nenhuma sair da conferência. Mas ainda faltava consenso – a principal regra de deliberação da ONU – entre os negociadores sobre metas e sobre a inclusão de desmatamento evitado como forma de mitigação.

Nessa rodada de alto nível, o Brasil será representado pelo ministro de Relações Exteriores, Celso Amorim, e pela ministra do Meio Ambiente, Marina Silva. No discurso do Brasil, Amorim destacará a vulnerabilidade da Amazônia frente ao aquecimento global. Alguns modelos científicos indicam que parte do bioma pode ser substituída por um tipo de savana – ou “desaparecer”, como disse o chanceler a jornalistas ontem.

VAIVÉM

Desmatamento evitado de florestas tropicais como forma de mitigação é um dos temas mais quentes de Bali. Ontem à tarde, a delegação brasileira estava confiante em um consenso, construído após Amorim orientá-la a buscar uma coalizão no grupo de trabalho sobre o tema. O Brasil aceitou a entrada de áreas degradadas na conta e também a referência ao manuseio sustentável de florestas. Mas, à noite, o consenso ruiu com considerações de países que, horas antes, haviam concordado com o texto.

A temperatura do debate pode ser medida pelos discursos. No começo da conferência, todos os participantes falavam que as mudanças de uso do solo, entre elas o desmatamento, correspondiam a até 20% das emissões globais anuais de gases-estufa. Agora já se ouve que derrubar floresta emite 20% (cravados) dos gases-estufa num ano.

PRIMEIRA MEDIDA PRÁTICA

A 13ª Conferência do Clima (COP-13) produziu seu primeiro benefício palpável, com direito a palmas, suspiros de alívio e sorrisos pelos corredores. Os participantes chegaram a um acordo sobre o Fundo de Adaptação, essencial para que os países menos desenvolvidos possam se preparar para as mudanças climáticas em curso. O dinheiro virá de uma taxa cobrada nas transações do carbono.

O acordo estabelece que o fundo será gerido interinamente pelo Global Environment Facility (GEF), a contragosto dos países em desenvolvimento. Segundo eles, a experiência mostra que dinheiro que cai no GEF é dinheiro perdido em burocracia, consultas e pesquisas intermináveis, sobrando pouco para a ação de fato. Para piorar, dizem, o GEF é administrado por (e, na prática, para) países ricos.

Em compensação, a destinação será decidida em conjunto, por um grupo de 16 representantes de países industrializados, emergentes e menos desenvolvidos. Decisões consensuais serão “mais valorizadas”, mas, no caso de impasse, valerá maioria por dois terços dos votos.

Segundo a Climate Action Network, que congrega diferentes organizações não-governamentais, o acordo deve ser comemorado e sua formatação permitirá a todas as partes acompanhar o que acontece com o fundo. Além disso, os principais beneficiados serão mesmo as nações com piores condições de adaptação – Brasil e China, apesar de elegíveis, usariam pouco do fundo já que têm condições de bancar boa parte de suas estratégias de adaptação.

O texto ainda tem de ser votado em plenária. É praxe que, após o consenso, seja aprovado tal como está.

envolvidos. Decisões consensuais serão “mais valorizadas”, mas, no caso de impasse, valerá maioria por dois terços dos votos.

Segundo a Climate Action Network, que congrega diferentes organizações não-governamentais, o acordo deve ser comemorado e sua formatação permitirá a todas as partes acompanhar o que acontece com o fundo. Além disso, os principais beneficiados serão mesmo as nações com piores condições de adaptação – Brasil e China, apesar de elegíveis, usariam pouco do fundo já que têm condições de bancar boa parte de suas estratégias de adaptação.

O texto ainda tem de ser votado em plenária. É praxe que, após o consenso, seja aprovado tal como está.